Alvo de polêmicas e críticas de governadores, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) da Segurança Pública chegou a 2025 com uma nova roupagem, que segundo o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, põe fim ao ponto central da discussão: a perda da autonomia dos estados. Segundo Lewandowski, “dúvidas foram completamente sanadas” após a nova redação que foi possível depois de cinco reuniões entre governo e estados.
Entre as alterações previstas pela PEC está a mudança de artigos que tratam das competências da União, sejam elas privativas ou em comum com os estados, municípios e com o Distrito Federal. Além de alterar o Artigo 144, sobre os órgãos que cuidam da segurança pública em todo o país.
Um parágrafo único criado no Artigo 21 esclarece as novas atribuições concedidas à União em relação à segurança pública e define que elas “não excluem as competências comum e concorrente dos demais entes federados”, “nem restringem a subordinação das polícias militares, civis e penais e a dos corpos de bombeiros militares aos Governadores dos Estados e do Distrito Federal”.
O novo texto prevê que, com a proposta, o Sistema Único de Segurança Pública (Susp), criado por lei ordinária, passe a ter status constitucional, assim como a previsão do Fundo Nacional de Segurança Pública e do Fundo Penitenciário, que atualmente estão estabelecidos em leis próprias.
Fundos que só poderão ser acessados pelos Estados, propõe o texto, caso as novas regras da PEC sejam seguidas. O que para o cientista político Eduardo Grin, é uma construção que o governo federal vem fazendo no sentido de tentar aumentar a coordenação federativa na segurança, nos moldes de como é feito hoje com o Sistema Único de Saúde (SUS).
“O governo hoje está dizendo para os governadores: querem dinheiro do Fundo de segurança? Vai ter que aderir às regras que estamos hoje definido. Esse tipo de questão começa a gerar uma condução e uma coordenação maior da esfera federal sobre a área de segurança pública.”
Para Grin, o diálogo feito pelo ministro Lewandowski e a edição do texto mostram prudência e se fazem necessários para começar a produzir uma coordenação maior nessa área.
Uma das vozes mais fortes contra a PEC e outras medidas na área da segurança é a do governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil). Depois da apresentação das mudanças, o chefe do executivo goiano alegou, em entrevista à CNN, mais uma vez que o texto é inconstitucional e não “tem chance” de ser aprovado pelos deputados e senadores.
Durante a entrevista à emissora, Caiado disse que irá trabalhar fortemente no Congresso Nacional, já que tem experiência no legislativo.
"Ele [governo federal] vai precisar de 308 votos na Câmara e 49 votos no Senado Federal, tá certo? Eles não têm esse voto para poder tirar as prerrogativas dos estados”, disse Caiado à emissora de TV.
Para o presidente da Associação dos Militares Estaduais do Brasil (AMEBRASIL) e coronel da reserva da PM de São Paulo, Elias Miler da Silva, faltou diálogo na elaboração da PEC, o que deve dificultar a passagem dela pelo Congresso.
“Uma falha democrática antes de apresentar essa proposta, tinha que chamar as entidades nacionais, das várias instituições que vão operar essa proposta, para que elas pudessem debater e apresentar propostas, para não ficar gerando desgastes políticos desnecessários.”
Também contrário à PEC, o governador Romeu Zema (Novo-MG) já havia falado sobre a proposta antes mesmo das mudanças serem apresentadas. Também à CNN, o governador de Minas defendeu que a Proposta detalhe medidas básicas de segurança antes de implementar soluções mais complexas e acredita que as novas medidas terão impacto limitado na redução da criminalidade.
“Não adianta ter o sistema integrado. É muito bom o sistema integrado, mas o bandido vai continuar solto”, disse Zema à CNN.
Além das mudanças na PEC, o Ministro da Justiça também assinou, na última sexta-feira (17), três portarias (855/2025, 856/2025 e 857/2025) que regulamentam as regras para o uso da força por policiais de todo o país, previstas no decreto do presidente Lula de 24 de dezembro de 2024.
O governador Caiado usou as redes sociais para criticar as medidas e levantou três pontos principais: a criação de um comitê para discutir com vários membros como ser feito o combate da criminalidade no país; a preferência pelo uso de armas não letais nos confrontos; e a avaliação do uso de algemas.
Segundo o governador de Goiás, as portarias teriam sido baseadas em decretos internacionais. “Com portarias como essas, a conivência e a leniência do governo com a criminalidade, fica mais do que clara. Nós precisamos de medidas enérgicas capazes de fazer valer a presença do Estado e não a submissão do Estado aos faccionados e ao crime do Brasil como hoje é uma realidade, exceção ao meu estado de Goiás.”
“Chantagem e falta de inovação”, diz Caiado sobre decreto que limita atuação das forças de segurança
O decreto presidencial que limita a ação policial das forças de segurança, publicado no fim de dezembro, reacendeu embate entre estados do Centro-Oeste, Sul e Sudeste e governo federal na área, além de dividir governadores pelo Brasil. No texto, diretrizes para o uso de armas de fogo e instrumentos não letais, condutas de abordagens, buscas domiciliares e atuação dos policiais penais nas unidades prisionais.
Logo nos primeiros dias a publicação gerou reações. Um dos primeiros a se manifestar foi o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União Brasil) que disse que o decreto traz apenas “chantagem e falta de inovação”. Ele criticou as diretrizes do decreto, que estabelece que os estados que não cumprirem as regras poderão deixar de receber os Fundos Penitenciário e de Segurança Pública.
Também contrário ao decreto, o governador do Distrito Federal, Ibaneis Rocha (MBD), em entrevista ao portal Metrópoles, disse que trata-se de “mais uma interferência do governo federal na autonomia dos estados e do DF, ferindo a Constituição”.
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No Sul e no Sudeste, os governadores formalizaram a crítica com uma nota conjunta pedindo a revogação do documento. Tarcísio de Freitas (Republicanos-SP), Cláudio Castro (PL-RJ), Romeu Zema (Novo-MG) e Ratinho Júnior (PSD-PR) alegam que a medida "beneficia a ação de facções e pune homens e mulheres que diariamente arriscam suas vidas em prol da sociedade".
Enquanto os governadores do Centro-Oeste, Sudeste e Sul do país reagiram contra o documento, no Nordeste a reação foi oposta. A manifestação também veio em forma de nota, assinada por nove governadores nordestinos, por meio do Consórcio Nordeste, e defende o documento alegando que ele “não altera a autonomia dos estados”.
“Ao contrário, ele reafirma a centralidade da prudência, do equilíbrio e do bom senso no exercício da atividade policial. Além disso, sublinha a necessidade de constante modernização das técnicas de atuação, promovendo mais segurança, tanto para os profissionais quanto para a sociedade, sempre com a preservação da vida como prioridade absoluta.”
A nota foi assinada por Fátima Bezerra (RN), Paulo Dantas (AL), Jerônimo Rodrigues (BA), Elmano de Freitas (CE), Carlos Brandão (MA), Rafael Fonteles (PI), Raquel Lyra (PE), João Azevedo (PB) e Fábio Mitidieri (SE).
O cientista político Eduardo Grin, explica o embate em torno do documento por conta da politização que ganhou.
“Os principais governadores do Sul e do Sudeste têm posições políticas completamente opostas às do governo federal e o tema da segurança pública é muito importante, pois é uma das duas atribuições constitucionais que garante autonomia de atuação dos estados. Essa é a maneira que o governo federal vem adotando de, lentamente, começar a produzir alguma coordenação nacional maior, como tem na saúde com o Sistema Único de Saúde.”
O especialista destaca que o tema da segurança pública é muito visível eleitoralmente.
“Quando esse problema vem à tona ele foi politizado, pois os governadores do Sul e do Sudeste, que saem à frente na disputa presidencial de 2026, não querem perder autonomia constitucional. Eles entendem que todo e qualquer movimento que o governo federal venha a fazer tem por finalidade reduzir — e até retirar – essa autonomia dos estados na segurança pública.”
Também por meio de nota, o Ministério da Justiça rebateu as críticas dos governadores do Sul e do Sudeste, dizendo que “o texto foi construído a partir de um amplo debate entre o governo federal, representantes dos entes federados, dos órgãos de segurança pública e da sociedade civil.”
E que além das forças de segurança dos estados, também fizeram parte do grupo de trabalho para a elaboração do decreto organizações não governamentais em defesa da paz.
A nota ainda esclarece que “o objetivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública foi o de construir um texto de consenso sobre o uso de instrumentos de menor potencial ofensivo (IMPO) pelos agentes de segurança pública em todo o país.”
A ideia central do decreto consiste em fazer com que o policial “use a força de forma progressiva, priorizando o diálogo, sem qualquer discriminação contra o cidadão brasileiro”, defendeu o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski.
O documento prevê que será necessário planejamento nas operações para "prevenir ou minimizar o uso da força e para mitigar a gravidade de qualquer dano direto ou indireto que possa ser causado a quaisquer pessoas".
Entre as diretrizes previstas pelo decreto, a que o uso da arma de fogo só poderá ser feito por profissionais da segurança pública federal como último recurso. O documento também prevê que armas de fogo não deverão ser usadas contra pessoa desarmada que esteja em fuga e veículo que desrespeite o bloqueio policial.
Além disso, o uso de força só poderá ser empregado quando outros recursos não forem suficientes e o nível de força utilizado seja compatível com a ameaça da situação. Também define que o uso inadequado deve levar à responsabilização do policial.
O sistema de reembolso das despesas pelos planos de saúde está regulamentado pela legislação (Lei 9.656/1998) e por resoluções da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Mesmo assim, inúmeros processos vão parar no Superior Tribunal de Justiça (STJ) para discutir sobre os limites e a obrigatoriedade do reembolso.
Em 2023, em decisão da Terceira Turma do STJ, ficou estabelecido que, quando a operadora do plano se omitir em indicar um prestador de serviço de saúde da rede credenciada, o beneficiário tem direito ao reembolso integral do tratamento. A advogada Ohana Galvão, especialista em direito aplicado aos serviços de saúde, detalha a decisão.
“Se o contrato do plano de saúde não tiver cláusula de reembolso, o beneficiário do plano só pode pedir um reembolso se não tiver um profissional médico ou clínica especializada credenciados e disponíveis para prestar o atendimento no município do beneficiário. Ou ainda, quando não houver um meio de transporte para que o beneficiário vá até uma cidade próxima que tenha aquele médico ou clínica dos quais ele está necessitando.”
Mas também existem contratos que permitem que os beneficiários escolham o médico ou clínica para realizar a consulta ou procedimento de saúde. “Nesses casos, o reembolso é feito até um valor limite que deve ser estipulado no contrato. Para isso, a operadora de plano vai ter que informar ao consumidor quais são os procedimentos ou especialidades que podem ser escolhidos livremente pelo beneficiário”, detalha a advogada.
As operadoras não são obrigadas a reembolsar procedimentos que não estão inclusos no rol da ANS ou que não são devidamente justificados por laudo médico.
A contadora Andreza Maria Ferreira Oliveira, de Campinas (SP), é mãe do Eric. Hoje, com 6 anos, ele é diagnosticado como portador do Transtorno do Espectro Autista (TEA), mas, desde os 16 meses de vida, a pediatra já notou alguns sinais.
“Eu já saí de dentro do consultório dela com as guias do plano de saúde para fazer todos os procedimentos que ele precisava”, conta Andreza.
A mãe de Eric diz que teve dificuldades para encontrar especialistas em TEA na rede credenciada, principalmente psiquiatra. A saída foi buscar o reembolso. Mas, no caso de Andreza, o contrato previa um limite de cobertura.
“A maioria dos psiquiatras hoje, principalmente o infantil, não está aberta a novos casos, principalmente quando você fala que a criança é TEA. Então, se você conseguir um, agarra com as duas mãos e fica. Por exemplo, uma consulta de um psiquiatra de R$ 700, eles reembolsavam R$ 450.”
Outro desafio que Andreza enfrentou foi a liberação do plano de saúde para que Eric conseguisse iniciar as terapias.
“Ele ainda não tinha um laudo fechado por conta da idade. Mas a médica disse que ele estava em investigação e que ele precisava iniciar o tratamento o mais rápido possível. Então foi preciso a gente abrir uma ocorrência no plano de saúde, subir para auditoria, fazer reclamação na ANS, aguardar na fila do profissional para fazer entrevista e saber se ele conseguiria atendê-lo.”
Andreza faz parte de uma rede de pais e mães de outras crianças com TEA e conta que já ouviu situações bem piores em relação aos planos de saúde.
“Nós ainda demos sorte; mas tem gente que tem a negativa logo de cara e ingressa no judicial. No meio do processo o plano começa a enroscar. Tira de uma clínica, põe em outra mais barata, que não tem o mesmo tratamento. Os planos sempre estão tentando achar uma brecha. E aí vai 4, 5 mil reais de advogado, mais despesa de processo. Até chegar na sentença, demora uns 2, 3 anos.”
Em 2023, a Terceira Turma do STJ decidiu que o tratamento multidisciplinar para portador de TEA deve ser amplamente coberto pelo plano de saúde. Dessa forma, os beneficiários têm direito ao reembolso integral dos procedimentos feitos fora da rede credenciada, incluindo sessões de musicoterapia. Mas a advogada Ohana Galvão ressalta que é preciso considerar algumas nuances.
“Houve uma importante resolução normativa (539/2022), onde a ANS definiu que algumas terapias específicas, quando prescritas por médico especialista, devem ser cobertas pelos planos de saúde. Agora, houve uma importante alteração na lei dos planos de saúde, onde ficou evidente que o rol da ANS não é taxativo, ou seja, ele não se esgota, e sim é exemplificativo. Isso quer dizer que os planos de saúde não podem se recusar a cobrir tratamentos e procedimentos que não constam no rol, mas, para tanto, tem que haver uma comprovação de eficácia desse tratamento, que seja baseada em evidência científica, em plano terapêutico ou em recomendações de órgãos de avaliação de tecnologias em saúde.”
O advogado Marcelo Depicoli Dias afirma que “ainda são frequentes as situações de rejeição de pedidos de aprovação de terapias recomendadas pelos médicos, mesmo pelos profissionais do próprio convênio. Boa parte das famílias de autistas se vê obrigada a procurar advogados e ingressar com ações para obter aquilo de que precisam. Felizmente, depois de uma fase de muita insegurança e decisões contraditórias, o Judiciário vem garantindo, na vasta maioria das vezes, o direito das pessoas às sessões”.
Ele também destaca um outro ponto importante: “são comuns situações em que os planos cessam o pagamento depois de algum tempo — por política interna ou problemas econômicos — e deixam os pais e responsáveis em situação complicada. Alguns determinam abrupta mudança de clínica e de profissionais, o que para autistas não é positivo e pode implicar em danos agudos ao processo de evolução. Outros simplesmente desamparam os responsáveis e aguardam a intervenção judicial, causando grande aflição à família”.
Na avaliação do advogado, “embora tenhamos um cenário menos incerto do que há alguns anos, ainda persistem os obstáculos na obtenção de cobertura ao tratamento do TEA. Não é um quadro tranquilo, em que a família se sinta acolhida, segura e tranquila com a perenidade da assistência. Evidente que há planos e planos, mas, no geral, os problemas são semelhantes”.
A advogada Ohana Galvão explica que para solicitar o reembolso de uma consulta ou procedimento médico, o beneficiário precisa preencher um formulário fornecido pela própria operadora do plano de saúde. Junto a esse formulário devem ser anexados os comprovantes de atendimento e notas fiscais de todos os procedimentos e materiais utilizados.
A especialista detalha o que fazer no caso de recusa da operadora em fazer o reembolso.
“De posse de todo esse material que comprova que o direito ao reembolso foi lesado, o beneficiário poderá judicializar a questão, requerendo o reembolso e até mesmo acumular esse pedido com uma indenização por danos morais, desde que fique evidente que houve uma negativa indevida, que ele passou diversos alvoroços que foram decorrentes dessa ilegalidade.”
Mas a advogada reforça que, por contrato, a operadora do plano de saúde pode não se comprometer a arcar com os 100% de reembolso, como é o caso de algumas que só oferecem 30% ou 50% do valor do procedimento.
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Já chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) a ação movida pela Procuradoria Geral da República (PGR) contra um dispositivo de uma lei aprovada este mês pela Assembleia Legislativa de Goiás que, entre outros pontos, tornaria crime inafiançável provocar incêndios em áreas de floresta durante o período de situação de emergência ambiental.
Na ação direta de inconstitucionalidade, a PGR alega que a Lei 22.978/2024 — sancionada no último dia 6 de setembro — invade competência da União. O dispositivo estabelece como crime provocar incêndio em florestas, matas, demais formas de vegetação, pastagens, lavouras ou outras culturas, durante situação de emergência ambiental ou calamidade. Fixa pena de quatro a sete anos de prisão, que pode chegar a 10 anos, caso o incêndio culmine em morte ou lesão corporal ou comprometa serviços públicos. Além disso, prevê o crime como inafiançável.
Antes disso, no dia 11, o TJGO já havia decidido, de forma liminar, a pedido do Ministério Público de Goiás (MPGO), sobre a inconstitucionalidade de parte da lei. O trecho considerado é o “que institui a Política Estadual de Segurança Pública de Prevenção e Combate ao Incêndio Criminoso no Estado de Goiás e cria o tipo penal que especifica”.
Todo questionamento sobre a lei consiste na invasão de poderes, explica o advogado especialista em Tribunais Superiores, Vitor Covolato.
“A PGR entrou com essa ação direta de inconstitucionalidade no Supremo questionando justamente a competência exclusiva do Congresso Nacional para legislar sobre matéria de direito penal. Embora o TJGO tenha determinado a suspensão de alguns artigos, o STF também vai decidir sobre a inconstitucionalidade desses dispositivos”, esclarece o advogado.
O governador de Goiás, Ronaldo Caiado (União), usou as redes sociais para demonstrar indignação com a decisão do TJGO. Para o governador, a lei seria uma forma de punir de forma exemplar os criminosos que vêm incendiando o estado.
“O que é que nós colocamos: esse cidadão será preso, a prisão dele é inafiançável, ou seja, vai ter que esperar na cadeia até que seja julgado o processo. E aí nós vamos conter e dar também o exemplo para aqueles que querem continuar no crime, para que não continuem, pois terá, sim, uma prisão definitiva dele até seu julgamento.”
Segundo o governador, o estado não quer invadir competência de outros poderes e legislar sobre pena.
“Nós estamos tratando de um assunto de urgência urgentíssima, onde o estado tem o direito concorrente – de acordo com o artigo 24 da Constituição. O que queremos é tratar dessa urgência já que enfrentamos cinco meses sem chuvas”, desabafou Caiado.
Questionada sobre os próximos passos, uma fonte do Governo de Goiás informou que como a decisão do TJ foi em caráter liminar, não cabe recurso. Quando o mérito da ação for julgado, aí sim, o estado irá recorrer.
Segundo informações do Corpo de Bombeiros de Goiás, 2024 já registra um aumento de 30% no número de ocorrências em relação ao ano passado. Sendo que só nos meses de agosto e setembro, mais de 4 mil focos de incêndio foram registrados.
Desde o início do ano, já foram mais de 9.500 ocorrências no estado, agravadas pelo tempo seco e temperaturas elevadas. O Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet) emitiu um alerta de perigo para toda a região Centro-Oeste, incluindo o estado de Goiás, com umidade variando entre 12 e 20%, alto risco de incêndios florestais e perigo à saúde.
O estado já contabiliza mais de 150 dias sem chuvas.
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O estado mais rico do país, São Paulo, gastou em 2022, 4,6% do orçamento total com despesas relacionadas à Justiça. Entre elas, salários de juízes, promotores, que giram em torno de R$ 30 mil mensais. Mas, proporcionalmente, é o Maranhão a Unidade da Federação com maiores gastos: 12,5% do orçamento estadual. Segundo um levantamento feito pela plataforma Justa, R$ 2,8 bi foram gastos pelo estado maranhense em 2022 para custear as despesas ligadas aos Tribunais de Justiça e Defensoria Pública do Maranhão.
O estudo considerou 12 estados brasileiros e, em todos eles, os gastos ligados a salários e despesas do Judiciário superam a União — que investe 1% do Orçamento no Poder Judiciário, Ministério Público e Defensoria Pública. No total, em 2022, os gastos dos estados levantados pelo estudo somam R$ 52,4 bilhões.
Fonte: Justa
O que para o economista chefe da Análise Econômica, de São Paulo, André Galhardo, não é ilegal, mas "imoral". “Olhando para o Brasil e considerando que quase 100 milhões de pessoas recebem uma renda per capita que não supera os R$ 300 por mês, ver um salário acima do teto constitucional — mais de de R$ 40 mil — isso é imoral”.
Dados do Tribunal de Justiça do Maranhão mostram que um juiz inicial ganha R$ 30.404,47 por mês, enquanto um professor da rede estadual — com jornada de 40 horas semanais — recebe R$ 6.867,68. E um médico, na capital São Luiz, ganha em média R$ 7.600,00 mês. Mas no ano de 2022, pelo menos 23 juízes receberam o salário de mais de R$ 70 mil em mês — superando o salário de um ministro do STF (R$ 41.650,92).
O levantamento mostra que as despesas com o Tribunal de Justiça do estado somaram R$ 2 bilhões naquele ano (2022). Valor maior do que a soma do que foi investido no Maranhão em transporte, assistência social, saneamento básico, indústria e habitação.
O que para o economista André Galhardo mostra a necessidade de o Brasil repensar o gasto público. “O governo precisa melhorar a qualidade do gasto público, precisa gastar de forma a respeitar aquilo que é sério para direcionar gastos para investimentos, por exemplo. A gente está sempre fechando a conta no vermelho e isso impede que o governo atue em questões que são muito importantes para o empresário e para as famílias brasileiras.”
Além dos altos salários pagos aos servidores da Justiça, ainda existem gastos extras — que, como revela o estudo — nem sempre é possível descobrir a natureza do benefício. O poder Judiciário goza de uma autonomia garantida pela Constituição Federal, prevista no artigo 92.
Segundo o assessor de orçamento Cesar Lima, “isso faz com que eles possam propor aos legislativos – tanto federal quanto estádios — normas que os beneficiem de forma indireta, aumentando os valores por eles recebidos.”
O assessor explica ainda que os membros do Judiciário — promotores, juízes e defensores públicos — não recebem horas extras, e sim, subsídios. No nível federal, muitos desses “penduricalhos” são amplamente combatidos e alguns, graças à repercussão pública, acabam derrubados. Mas a nível estadual, esses “extras” acabam passando despercebidos, como explica Lima.
“É importante que a imprensa se debruce sobre isso, para que dê visibilidade a essas questões, que elas possam, na medida que sejam irregulares, possam ser combatidas. A partir do momento que a sociedade está ciente do problema, gera-se um embate muito mais efetivo contra esse tipo de ocorrência”.
Projeto também mantém expedição de habeas corpus de ofício por qualquer autoridade judicial
Vai à sanção presidencial o projeto de lei que favorece o acusado quando houver empate no julgamento em matérias penal ou processual penal (PL 3453/21). A Câmara dos Deputados rejeitou a emenda do Senado — que previa um prazo de três meses para recomposição do tribunal, nos casos de ausência de um dos julgadores. Os deputados mantiveram o texto que determina a proclamação imediata da decisão mais favorável, mesmo quando o julgamento ocorrer sem a totalidade dos integrantes.
A advogada nas áreas de direito penal e processual penal Ana Colombo entende que o texto vem para consolidar as diretrizes estabelecidas pela Constituição Federal de 1988 de que a dúvida sempre deve ser interpretada em favor do réu.
“O nosso sistema penal e processual penal tem como pilar a presunção de inocência, de modo que a declaração de culpa exige a existência de uma certeza. Quando se está diante de um empate a dúvida que permeia o caso ela fica escancarada e o ônus dessa dúvida deve ser suportado pelo Estado, que é quem tinha o dever de produzir provas capazes de dirimir essa dúvida razoável”, explica
O autor da proposta, deputado federal Rubens Pereira Júnior (PT-MA), afirmou ao portal Brasil61.com que o objetivo do projeto é, justamente, afastar qualquer dúvida sobre o procedimento a ser adotado nos casos de empate no julgamento e garantir a aplicação da presunção da inocência. O parlamentar justifica a rejeição da emenda do Senado.
“O Senado optou por resolver a questão do empate dando mais tempo para o judiciário. Em alguns casos, de até três meses. A Câmara entendeu que esse prazo não era razoável, que o judiciário já tem tempo demais, ainda mais que estamos falando em processos de natureza penal e processual penal. Portanto, um dia preso injustamente é muito tempo”, pontua.
Segundo o deputado, não foi feito um levantamento sobre possíveis impactos carcerários e nem de quantos processos podem ser afetados. Ele argumenta que a previsão de quem pode ser beneficiado, resultaria na individualização e, como consequência, na contaminação do debate.
O deputado Gilson Marques (NOVO-SC) critica a aprovação do texto, em especial sem as emendas do Senado. Em nota, ele afirma que as sugestões dos senadores "eram mais coerentes tanto na delimitação de regras sobre o empate, como na inclusão da possibilidade de convocação de outro magistrado em casos de impedimento ou suspeição, quanto na limitação de concessão de habeas corpus de ofício apenas aos processos em que o magistrado estiver atuando".
Para o parlamentar, a Câmara "aprovou mais uma lei que vai favorecer bandidos e, pior, de forma simbólica, sem que a população possa saber como votou cada deputado", pontua.
O Senado também sugeriu que apenas autoridades judiciais atuantes no processo poderiam expedir ordem de habeas corpus sem que haja uma solicitação específica da parte interessada, ou seja, por iniciativa própria. A alteração, no entanto, também foi rejeitada na Câmara. O projeto aprovado estabelece que qualquer autoridade judicial poderá expedir de ofício ordem de habeas corpus, individual ou coletivo, mesmo sem atuar no processo.
O habeas corpus é um dos chamados remédios constitucionais. A Constituição Federal de 1988 determina que deve ser concedido “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder".
Especialista em segurança pública, Leonardo Sant’Anna explica que toda ação na área de segurança tem que acontecer no momento em que um comportamento social inadequado é efetivamente caracterizado como existente. Quando existem dúvidas em relação ao cometimento de determinado comportamento, significa que as informações recebidas não foram suficientes para comprovar o ato. Portanto, segundo o especialista, o projeto aprovado incide na segurança pública apenas elevando a necessidade de modernizar a atuação.
“O impacto na segurança pública vem da modernização das ações, da implementação de um maior investimento para que não haja erro, não haja equívoco na comprovação de uma quebra de regra, de uma quebra de conduta social. Nós precisamos oferecer mais capacitação, mais treinamento para os profissionais que são dedicados em indicar que algo aconteceu a partir de uma quebra de regra social”, pontua.
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Projeto de lei favorece o réu em empates em julgamentos na esfera penal
Retorna à Câmara dos Deputados o projeto de lei que favorece o acusado em casos de empate em julgamento, em órgãos colegiados, em matéria penal ou processual penal. O PL 3453/2021 também prevê que autoridade judicial pode expedir ordem de habeas corpus, individual ou coletivo, por iniciativa própria — isto é, sem que haja uma solicitação específica da parte interessada. A proposta foi aprovada no Senado com alteração e, por isso, deve ser submetida a nova análise da Câmara dos Deputados — Casa de origem do projeto.
Advogada nas áreas de direito penal e processual penal, Ana Colombo avalia que o objetivo do projeto é, na verdade, garantir maior segurança jurídica aos operadores do direito — e não deve trazer grandes impactos. “As previsões trazidas pelo projeto, na verdade, refletem uma prática que já é adotada nos tribunais e não representa uma grande novidade. Ele vem muito mais para legislar do que para mudar a prática. E aí, por não promover mudanças significativas na prática, a tendência é que o impacto desse projeto não seja tão expressivo em se tratando de sistema carcerário”, argumenta.
De acordo com a advogada, atualmente existe uma lacuna na legislação brasileira — o que causa dúvida no procedimento a ser adotado, mesmo com decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) favoráveis ao réu em casos de empate. “O projeto de lei vem justamente para uniformizar esse entendimento e regular a forma como isso deve ser tratado em todos os tribunais do país, quando a gente está tratando de julgamentos colegiados em matéria penal e processual penal”, destaca.
O senador Sergio Moro (União-PR) afirma que o projeto consagra na lei o princípio do “in dubio pro reo” — expressão latina que, em tradução livre, significa “na dúvida, a favor do réu”. Para o parlamentar, a medida evita condenações injustas. Ele explica que o texto aprovado estabelece que, se houver empate com ausência de um dos julgadores — com exceção do habeas corpus — deve-se esperar o retorno do juiz faltante e, caso a previsão de ausência seja de até três meses, convoca-se um substituto.
“Então, vamos supor, numa apelação há empate de dois juízes para cada lado, aguarda-se o quinto juiz para desempatar ou se ele for ficar longe muito tempo, se convoca um substituto na forma do regimento. Já no caso do habeas corpus, como é urgente e não se pode esperar, o empate sempre favorece o acusado”, ressalta o senador.
O habeas corpus é um dos chamados remédios constitucionais. A Constituição Federal de 1988 determina que deve ser concedido “sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder". O projeto original previa que qualquer autoridade judicial poderia expedir de ofício ordem de habeas corpus, mesmo sem atuar no processo. No Senado, o texto foi modificado pelo relator, senador Weverton (PDT-MA). A especialista em direito penal Ceres Rabelo explica o que mudou.
“Houve um pedido de alteração, o relator do projeto incluiu no texto uma expressão prevendo que a autoridade poderá expedir o HC apenas no processo judicial que estiver atuando. E aí acontece que houve o retorno do projeto para a Câmara dos Deputados, porque vai gerar uma insegurança muito grande se qualquer juiz puder expedir a ordem de habeas corpus de ofício, ainda que não esteja atuando naquele processo”
Para Rabelo, o processo penal é um jogo que, em caso de empate, a defesa ganha. “Existe o princípio da presunção da inocência ou da presunção da não culpabilidade no direito brasileiro. Então, não cabe ao acusado provar que ele é inocente, ele é presumidamente inocente. Cabe ao órgão acusador comprovar, de fato, a autoria e a materialidade delitiva”, pontua.
Na análise da matéria, o relator afirma que, na prática, “a ordem de habeas corpus tem sido concedida de ofício ainda que a ação ou o recurso em que inicialmente veiculado o pedido de cessação da coação ilegal não tenham sido conhecidos”. E lembra que essa prática chegou a ser questionada pelo Ministério Público e discutida no STF, mas sem definição.
Representantes do Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) e do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram) assinaram, na última sexta-feira (5), um acordo para elaborar planos de segurança pública para municípios localizados no entorno de mineradoras. O Acordo de Cooperação Técnica (ACT) tem três objetivos: prevenir as cidades contra os ataques de quadrilhas que usam o formato de "novo cangaço", preservar os recursos naturais e incentivar o desenvolvimento econômico.
A meta principal da cooperação técnica firmada na assinatura do documento é fortalecer a presença do Estado brasileiro em territórios vulneráveis à invasão ilegal de garimpeiros e operacionalizar planos de defesa e proteção da população de cidades onde são extraídos minérios de grande valor.
O acordo prevê intercâmbio de boas práticas para o desenvolvimento de pesquisas, incremento tecnológico e capacitação de equipes para atuação nas proximidades dos municípios mineradores.
Por tratar-se de um ACT, a princípio não está prevista a transferência de dinheiro ao Ibram. Conforme a assessoria do MJSP, caso seja necessário o repasse de recursos, as transferências “serão viabilizadas por intermédio de instrumentos específicos”.
Durante a solenidade de assinaturas, o ministro Ricardo Cappelli defendeu a importância de se garantir maior segurança ao setor mineral do país, protegendo os investimentos e a economia brasileira. Segundo ele, o ACT deve assegurar a integração operacional e de informações que envolvem o assunto “mineração”.
"Tenho certeza que as mineradoras têm muita informação, também, a respeito da movimentação da mineração ilegal”, afirmou. “Então essa parceria com o setor, e também com a Agência Nacional de Mineração, com o Ministério de Minas e Energia, é mais um passo para que a gente possa auxiliar na Segurança — no que diz respeito a um setor estratégico da economia brasileira”, declarou o ministro interino do MJSP.
De acordo com o Ibram, entre 2010 e 2019 foram registrados 11 assaltos a cargas de ouro no Brasil. O vice-presidente do Instituto, Fernando Azevedo e Silva, afirmou que buscou o Ministério da Justiça e da Segurança Pública porque o setor entendeu que eram necessárias medidas do poder federal para combater a ação das quadrilhas.
Azevedo e Silva afirmou que a assinatura do acordo representa a união de setores estratégicos da sociedade. "É o Estado brasileiro tomando providências, em parceria com a iniciativa privada, para debelar a ação de quadrilhas organizadas que pilham preciosas cargas de minério e causam graves problemas de segurança aos municípios, bem como danos à economia e também ao meio ambiente”, declarou, para concluir em seguida: “Isso evidenciou a necessidade de ação coordenada, a nível federal, para avançar na luta contra o crime organizado”.
Também estavam presentes diversos representantes da ANM (Agência Nacional de Mineração), entre eles o o diretor-geral Mauro Henrique Moreira Souza, e representantes do Ministério de Minas e Energia.
O Ibram possui 135 empresas associadas, o que representa 85% da produção mineral do país e corresponde a 4% do Produto Interno Bruto (PIB). Somente as minas de ouro e diamante estão em 18 municípios do país, somando população aproximada de 700 mil pessoas.
Na avaliação do vice-presidente do instituto, Fernando Azevedo e Silva, o acordo de cooperação técnica é fundamental para a proteção da atividade econômica, principalmente em municípios pouco desenvolvidos, que tornam-se mais suscetíveis à invasão da mineração ilegal.
Cerca de 25 mil moradores do Ceará podem se tornar cidadãos piauienses por conta de uma disputa territorial entre os dois estados movida em 2011. Na ação civil originária (ACO) 1831, movida pelo Piauí no Supremo Tribunal Federal (STF) — e que tem como relatora a ministra Cármen Lúcia —, o estado requer 3 mil Km² do território cearense, o que atinge 13 municípios do Ceará e oito do Piauí.
A pedido da ministra relatora, o Exército está fazendo uma nova perícia técnica para dizer qual unidade da federação, de fato, é a dona do território. A perícia é dividida em quatro fases: planejamento; imagem e coleta de dados; análise de dados históricos; e geração de produtos periciais. Os peritos do estiveram em setembro e outubro na área disputada e foram acompanhados por representantes do Ceará e do Piauí. A previsão é que o trabalho seja concluído até maio de 2024.
O advogado especialista em Tribunais Superiores Vitor Covolato explica em que etapa o Supremo está em relação a esse recurso.
“Este momento que estamos agora é a fase que chamamos de fase instrutória, quando se faz a prova do processo. O Exército vai funcionar como perito. Vai fazer os levantamentos geográficos, georreferenciados, para dizer — do ponto de vista técnico — quem tem a titularidade desse território. E depois isso vai para julgamento no Supremo.”
As áreas disputadas possuem reservas naturais, hídricas, minerais e extensas áreas de plantio, com potencial turístico e de produção de energia eólica.
Segundo o economista e professor da Universidade de Brasília (UnB) César Bergo três motivos levam os estados a disputar territórios. O primeiro com relação ao tamanho do estado com relação ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM) — quanto maior o território, maior o volume de recursos; outra razão que pode motivar a disputa é a questão política — com relação à quantidade de eleitores e formação de câmaras municipais; mas, segundo Bergo, outra questão pesa mais dessa briga.
“A área é rica em minério e também é uma área que pode ter um potencial grande para energia elétrica eólica e solar, principalmente. Por isso a disputa entre os dois estados. E como evoluiu bastante a questão cartográfica em termos de verificação, o Piauí reivindica essa área — que o Ceará coloca como dele — mas diante desses levantamentos mais modernos que foram feitos.”
Para o economista, existe ainda uma questão social que deve ser levantada, já que “se houver a mudança, os cearenses passam a ser piauienses”, explica Bergo. Mas, para o economista, a grande questão ali é mesmo econômica. “Se não tivesse a questão econômica envolvida, essa briga já teria sido solucionada há muito tempo.”
A disputa tem origem na interpretação do Decreto Imperial 3.012, de 1880, que determinou a troca de territórios entre os dois estados. Enquanto o Ceará recebeu a Comarca de Príncipe Imperial — que corresponde aos atuais municípios Crateús e Independência, ambos no Ceará —, o Piauí recebeu em troca a região da Freguesia de Amarração — hoje municípios Luís Correia e Cajueiro da Praia, no Piauí.
Entre a área que o Ceará cedeu, ao norte, no litoral, e a que foi recebida, mais ao sul, no sertão, existe a Serra da Ibiapaba, que é a divisa natural entre os dois estados — e o foco da divergência.
O Piauí entende que parte da Serra da Ibiapaba pertenceria ao estado. Já o Ceará contesta. Mas segundo a análise dos documentos, a Serra da Ibiapaba não teria relação com essa divisão — e por isso permaneceu inteiramente no território cearense.
A independência dos três poderes — Executivo, Legislativo e Judiciário — é reconhecida pela Constituição brasileira. Mas para que exista o equilíbrio e a participação de cada um, de acordo com suas atribuições, é necessário independência e harmonia entre eles. Segundo o analista político, doutor em História Política e professor do Colégio Presbiteriano Mackenzie (CPM) - Tamboré, Victor Missiato, atualmente existe uma certa instabilidade por conta de um ativismo judiciário.
Em entrevista ao Brasil61.com, Missiato defende que as mudanças culturais, religiosas e políticas da sociedade brasileira estão influenciando radicalmente uma transformação no perfil do Poder Judiciário brasileiro — e também do Poder Legislativo.
Brasil 61: O que diz a Constituição brasileira sobre essa questão da interferência do STF nas atribuições do legislativo — e de que forma isso contribui para o funcionamento das instituições das três esferas de governo?
Victor Missiato: “A Constituição brasileira reconhece a independência dos três poderes. Portanto, nós temos duas palavras extremamente importantes para entendermos o papel dos três poderes na Constituição brasileira, no caso Legislativo, Executivo e Judiciário. Tratam-se de poderes independentes e harmônicos entre si. Portanto, no texto constitucional, a harmonia e a independência entre os poderes são expressões fundamentais para entender a importância de se buscar esse equilíbrio entre os poderes, constantemente. Então é fundamental nós pensarmos nesses dois elementos, independência e harmonia entre os três poderes no texto constitucional”.
Brasil 61: Nós conseguimos observar isso atualmente? Existe esse equilíbrio?
VM: “Atualmente, esse equilíbrio está muito instável por conta de um ativismo judiciário que decorre dos últimos 15 anos, principalmente, que vem colocando cada vez mais a figura do Judiciário como um papel muito protagonista no que diz respeito a legislações políticas do país — e não apenas mais interpretações constitucionais. Então, o que significa esse ativismo judiciário? Que ao invés de recorrer a casos muito peculiares de interpretações constitucionais do Brasil, a Suprema Corte vem legislando em algumas políticas, atravessando muitas funções do Legislativo e ao executar essa lei também do Executivo. Portanto há sim um desequilíbrio que está pendendo para um protagonismo do judiciário. O que é interessante ao percebermos esse equilíbrio instável é que o Legislativo nos últimos anos vem também agora procurando equilibrar essa força dentro dessa instabilidade sem harmonia. E a polêmica envolvendo a questão do marco regulatório agora é um dos sintomas principais dessa instabilidade”.
Brasil 61: Podemos associar o cenário atual do Brasil às mudanças no perfil político, cultural, econômico e religioso da sociedade?
VM: “Sem dúvida alguma, as mudanças culturais, religiosas, políticas da sociedade brasileira nos últimos 30 anos estão influenciando radicalmente uma transformação no perfil do poder judiciário brasileiro e também do poder legislativo. De um lado, nós temos a ascensão de uma visão progressista de poder, principalmente na área do direito, que está relacionada a esse ativismo judiciário, que faz parte de uma influência muito forte do próprio judiciário norte-americano, em que há um poder muito grande do judiciário no que diz respeito à atuação política de seus juízes.
Por isso que é um poder judiciário muito federalizado e ao mesmo tempo muito potencializado nos Estados Unidos, onde a cultura jurídica cada vez mais tende para uma mudança através dos costumes. Então, nós temos por parte da representação direta do povo brasileiro, um posicionamento mais conservador no poder legislativo e de outro, numa camada mais média da população brasileira, uma ascensão do ativismo judiciário mais progressista. E, por isso, esses embates”.
Brasil 61: Como o STF tem se comportado diante desse quadro? Como explicar a atuação do Judiciário no cenário atual?
VM: “É fundamental nós percebermos uma transformação do perfil judiciário brasileiro que historicamente estava mais ligado ao chamado Civil Law, que tem uma origem romano-germânica no conjunto das leis, ou seja, num padrão das leis, num sentido mais tradicional das leis, da formulação dessas leis. E em contraposição agora vem acendendo cada vez mais uma influência do chamado Common Law, que é uma família jurídica baseada na tradição inglesa e que depois passou para os Estados Unidos, que tem muita força na jurisprudência e no acompanhamento dos costumes da sociedade”.
Brasil 61: E de que forma o pacto federativo acaba sendo afetado e quais são as consequências para os municípios, onde de fato vivem as pessoas?
Victor Missiato: “Quando muitas das pautas dentro dos municípios, da movimentação das pessoas, da circulação de mercadorias, ela é afetada com decisões inclusive monocráticas. Quando apenas um ministro decide, estabelece aquilo antes de ir para o plenário e aquilo fica valendo por alguns meses talvez anos. Então esse tipo de posicionamento monocrático centralizador dificulta muita segurança jurídica da própria economia dos municípios do próprio cotidiano dos cidadãos que acabam ficando a mercê como eu disse anteriormente de decisões até mesmo monocráticas. Um juiz decidindo uma organização social de um país de mais de 200 milhões de pessoas. Então é algo que principalmente dentro do poder legislativo deve se criar mecanismos para um novo equilíbrio entre os poderes. E aí é fundamental que os três poderes, dentro dessa tentativa de busca pelo equilíbrio, não tente entrar em conflito um contra o outro, o que acaba gerar uma crise institucional muito forte. Por enquanto, isso está longe de acontecer, mas é importante ficarmos sempre atentos a essas disputas políticas dentro dos poderes”.